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Mensagem por Gol D. Roger Sex Set 28, 2012 6:14 am

Título: Algoritmo
Autor: Roger França
Gêneros: Ação, Aventura, Amizade, Drama, Fantasia, Lime, Mistério, Romance
Classificação: 16+ (palavrões, sexo implícito, álcool)

Sinopse nova ficou grande, vou colocar em spoiler. Mas não tem "spoilers" nela. '-'
Spoiler:

Olá. o/

Já faz um bom tempo que comecei a pensar nesta história. É uma história com OCs, ou seja, sem nenhuma aparição de personagens do anime, e baseada nas ideias da franquia, com personagens meus. Coloquei a classificação como 16+, talvez seja muito, talvez seja pouco... Não acho que seja uma história realmente pesada, apenas mais "realista" e menos "Lucky Star". Dê uma chance, talvez você goste ;) Meu estilo preferido de escrita é “livro”, pois não gosto de fazer uso de emoticons, imagens ou músicas no meio do texto (mas a fic tem músicas, que postarei separadamente).

Os conceitos da história, além de Digimon, são baseados pesadamente em animes de que eu sou fã, e que montam o "formato" dos conceitos de lutas e acontecimentos que me marcaram, como Katekyo Hitman REBORN!, Hunter x Hunter, e outros famosos demais pra precisar falar o nome (calma, não é nada de crossover de fã retardado, ok?).

Há três sagas: Abdução, Choque e Algoritmo. E sim, a última saga tem o mesmo título que a própria história, e também é responsável pelo motivo do título ser este.

Algoritmo

Prólogo Principal: A agência

Saga I: Abdução

Prólogo I: Uma decisão covarde
Capítulo I: A impulsiva, o falso e o esquisito
Capítulo II: Vaniur
Capítulo III: A mensagem na esfera

Saga II: Choque

Saga III: Algoritmo

Clique em Gostei aqui embaixo o\ e se inscreva aqui em cima! o/
Comentem, diga o que está faltando ou o que gostou! A opinião de vocês é muito importante =)


Última edição por Gol D. Roger em Sáb Nov 17, 2012 11:31 am, editado 9 vez(es)
Gol D. Roger
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Algoritmo Empty Re: Algoritmo

Mensagem por Gol D. Roger Sex Set 28, 2012 6:17 am


Prólogo Principal: A agência


Um pálido sol começava a surgir timidamente por trás das nuvens cinzentas daquele calmo e tranquilo dia de primavera. Debaixo do céu, como em contraste à natureza que parecia sonolenta e preguiçosamente tentando acordar, as pessoas moviam-se na cidade com a pressa habitual, as cabeças ocupadas e carregadas com o estresse de sempre, começando cedo. Vidas que se moviam, vidas que traçavam seus passos, vidas que precisavam ser criadas... Vidas que surgiam.

Não era fora do comum haver discussões no prédio daquela agência em dias de semana. Os que eram calouros naquele trabalho estranhavam, mas depois acostumavam-se com o jeito flutuante e atrapalhado dela. E de fato, Marta já havia acostumado-se, também, a constantemente levar reclamações por seu desleixo e falta de atenção.

- É a terceira vez este mês! Quantas vezes preciso dizer para não confundir as fichas e nem tirá-las da ordem alfabética? – queixava-se a voz aguda de uma mulher que devia ser baixinha, pois seu topete ruivo mal aparecia por trás da interminável papelada em cima da mesa à sua frente. - Tem ideia do atraso que isso vai nos trazer desta vez?

E lá estava sua chefe; como sempre, a reclamar-lhe. A própria Marta já não sabia o porquê de não ter sido despedida após tantos anos. Nas horas em que pensava nisso, porém, sorria diante de sua lentidão: afinal de contas, trabalhava para sua mãe e sabia que seria perdoada quantas vezes possível, apesar de seu incrível histórico de desleixos acidentais. Mas sinceramente ela tentava seu melhor a cada dia, e parecia satisfeita com a vida parada e pequena que levava.

-Não, Marta, deixe que eu faço isso. Vá levar o lixo para fora, vá.

Ao sair pela porta dos fundos do abafado prédio, ela olhou para o sol que começava a sair. Ele iluminou seu rosto de meia idade, semi-enrugado, com a expressão passiva e aérea de sempre, como quem está sempre a se perder em pensamentos distantes; e os cabelos loiros na altura dos ombros, em cachos meio desarrumados. Espreguiçou-se como pôde, enquanto segurava os sacos de plástico, aproveitando a luz e o calor pela primeira vez no dia, para compensar a falta que fizeram mais cedo. O lugar era fechado por altos muros, exceto por um dos lados, que dava para uma cerca de arame, de onde o sol aparecia. No canto oposto à porta estava o latão de lixo, que basicamente era a única coisa de mais na área quadrada e vazia.

Vizinho ao prédio da agência em que ela trabalhava, estava outro prédio, cujo muro estava agora a encarar. Vez ou outra, quando passava pelo pátio vazio em que estava, costumava ouvir os ruídos do prédio afiliado à pequena agência; já haviam se tornado familiares.

Após terminar o serviço e espanar as mãos no antigo vestido, ela encostou-se na parede, e pôs-se um pouco a pensar. Respirando fundo, ela fechou os olhos e sentiu um pouco mais do calor do sol contra seu rosto, esquentando seu corpo como quem ajuda a tirar todo o sono e acordar plenamente. De repente, ela teve a impressão de a luz do sol contra suas pálpebras ficar um pouco mais forte que o comum. Levantando-se da suja parede, abriu os olhos e tomou um susto.

Foi então que ela reparou, olhando para o chão mais ou menos no centro do espaço quadrado em que estavam os fundos do prédio. Brilhando com uma luz azul intensa, e gradualmente ganhando uma forma sólida, estava um embrulho familiar, que nem mesmo seus desleixos poderiam deixar passar da primeira vez. Imediatamente ela relacionou a forma do embrulho ao prédio vizinho. Era a única possibilidade.

-Ei, Marta! Por que está demorando tanto? Venha cá pra dentro logo! – mesmo em algum lugar fechado da agência, a voz de sua mãe sempre arranjava uma maneira de atravessar e se fazer ouvida, aguda e estridente. Sem saber o que fazer, totalmente confusa, ela pegou o embrulho, que definitivamente era aquilo que pensava, e entrou.

O destino agiu naquele dia.
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Algoritmo Empty Re: Algoritmo

Mensagem por Gol D. Roger Sex Set 28, 2012 6:22 am

Saga I: Abdução

Prólogo: Uma decisão covarde


Era o ritual da Primavera.

De frente para o vasto mar, o Santuário impressionava pela sua forma pura e majestosa. Era como um palácio azul-celeste e cristalino, que dava a impressão de haver sido talhado a partir de um gigantesco cristal no passado, erguendo-se imponente no meio de um terreno montanhoso que deixava aparecer pequenos rios e cascastas brilhantes ao seu redor, aqui e ali. Da torre mais alta do Santuário estavam a sair, a constantes intervalos, raios luminosos de um verde quase transparente, acompanhados por outros mais intensos, que lembravam um rosa profundo. Os raios ganhavam altitude rapidamente, par a par, e uma vez que estavam bem alto no céu de poucas nuvens, faziam uma pequena pausa condensada antes de explodirem silenciosamente em velocidade e seguirem para alguma direção aleatória. E no alto de um penhasco não muito distante do Santuário, um alto guerreiro que transparecia no ar sua força e importância estava a observar tal espetáculo fazia algum tempo.

A aparência do cavaleiro era tão impressionante quanto o espetáculo que ocupava-se em assistir. Vestia uma armadura enorme como o seu corpo, de um negro brilhante com detalhes dourados, e ordenada de grandes ombreiras e braceletes com marcas de triângulos; uma grande capa azul ferida por diversos rasgos, parada como o vento, e um par de algo que lembrava asas, que lhe caíam pelas costas. Tinha olhos amarelos como a única parte visível de seu corpo, dentro de um capacete negro como a armadura, e que, assim como seu abdômen, era adornado por uma grande pedra vermelha e triangular. Não era outro senão o líder perdido, o mais poderoso, o heroi que literalmente salvara o mundo há algumas horas. Mas os pensamentos de quem estava por trás dele não eram de satisfação.

- E agora? – ele escutou a familiar voz, similar a um rosnado, de Raid. Nenhum som, porém, se propagou no penhasco, exceto por uma leve brisa ocasional.

Ele não respondeu imediatamente. Acontecera tudo tão rápido... A sua felicidade por finalmente sair das trevas em que estavam e poder olhar para um céu tão claro como não se lembrava de já ter visto. A mesma felicidade que acabou aumentando, quando pôde salvar desconhecidos de um destino terrível. E tudo isso destruído no momento em que descobriu que jamais poderia realizar seu único desejo.

- Eu... Você sabe o que eu quero. Mas é impossível agora... Yggdrasil disse – ele começou.

- Mas ele também falou que há uma chance de dar certo se tentarmos, não foi? – novamente o rosnado agradável ecoava no fundo de sua mente. – Mesmo que o risco seja...

- Raid... – ele ficou em silêncio. Era estranho não ter o que falar para um companheiro de tanto tempo. Ele sabia do sacrifício que Raid estava disposto a fazer por ele, caso não desse certo. Sabia de como poderia ter uma vida nova nesse mundo que tanto o fizera sofrer... Mas não. Jamais poderia gostar desse mundo. Não mais. –Eu não quero viver aqui e fazer parte deles para sempre. Mas...

Seu companheiro ficou em silêncio.

- Eu sou um covarde. Mesmo depois de tudo... Não tenho coragem de arriscar minha vida para vê-los. Mesmo sendo o meu maior desejo... – e pela enésima vez, as lembranças daqueles rostos queimaram intensamente em sua memória, inalcançáveis por causa de seu medo.

O festival da Primavera acabara. Não mais a torre do Santuário estava a soltar seus raios de coloridos para o mundo. Agora, tudo estava quieto. O mar brilhava calmamente à frente do palácio.

- Vai fazer mesmo isso? – foi tudo o que Raid pôde dizer, ao entender exatamente o que o amigo pretendia. Como seria possível tamanha depressão? E ele, seu único e eterno amigo, não conseguia pensar em nada para impedi-lo de algo tão drástico... Raid começava a sentir desespero frente à situação; ele era inútil.

Não houve resposta. Ele estava decidido, repleto de desgosto.

- Só quero... que saiba uma coisa. – rosnou ele de novo, com algo que deveria ser um suspiro trêmulo. – Se um dia mudar de ideia e quiser tentar vê-los – a ideia atormentou sua consciência -, pode contar comigo. Sei que isso é óbvio para nós, mas...

- Eu... sei. Eu sei... – respondeu ele, sem demonstrar emoção. Já vivera o suficiente para não se emocionar com tais coisas, e Raid sabia.

Mesmo se houvesse alguém observando o cavaleiro negro e dourado no alto do penhasco, tudo o que veria seria seu semblante oculto calmamente observando o espetáculo até o seu final, em absoluto silêncio. Nenhuma criatura pôde escutar a conversa que acabara de acontecer no espírito do cavaleiro, que agora descia devagar pelo caminho em direção ao palácio.

-------------------------------------------

Estou na metade do primeiro capítulo de fato, daqui a alguns dias devo estar com ele pronto para postar.


Última edição por Gol D. Roger em Ter Out 02, 2012 4:52 am, editado 2 vez(es)
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Mensagem por Gol D. Roger Seg Out 01, 2012 6:40 pm

Está pronto o primeiro capítulo, acabou ficando enorme mas de qualquer jeito fiquei muito satisfeito com o resultado, espero que gostem e comentem. =)

Saga I: Abdução

Capítulo I: A impulsiva, o falso e o esquisito


[ No início, cada um de nós tinha seu horizonte traçado...
BON VOYAGE!
Bon-Bon Blanco ]


Havia algo de pesado no ar típico de domingo parado que envolvia a rua, normalmente já inerte. A ociosidade e o vazio da avenida longe do centro, quase sem carros ou pessoas, eram quase palpáveis, como que um convite à preguiça e à desocupação. Não ajudava o fato de o sol tentar, sem sucesso, atravessar seus raios pelas espessas nuvens que cobriam grande parte do céu. No extremo da rua estava um clube de esportes com uma aparência vazia e solitária, apesar de a fachada verde e as portas estarem bem cuidadas.

Na calçada ao longo da rua vinham dois adolescentes, que não aparentavam ser mais velhos do que estudantes. O primeiro chamava-se Bruno. Era alto e magro, de uma pele talvez clara demais para passar despercebida, e com um cabelo escuro, curto e fino, que caía pela testa de seu rosto pontilhado por sardas. Na frente dos olhos negros usava estranhos óculos, de aros brancos com lentes quadradas e curvadas nas pontas, que lhe davam um ar exageradamente nerd e incomum. Vestia uma simples e larga camisa verde-escura de mangas curtas, jeans desgastados à altura dos joelhos, com grandes bolsos, e calçava um par de chinelos pretos que arrastava lentamente com os pés enormes enquanto andava sonolento.

Já o outro rapaz era bem mais baixo que o outro, ainda mais magro e parecia ser mais novo. Tinha uma pele bem mais amorenada e seus cabelos eram loiro-escuros e em cachos. Usava uma camiseta preta sem mangas, com detalhes brancos e adornada por desenhos vermelhos, que ficava demasiado folgada em seu corpo fino; além de uma leve bermuda azul-clara decorada de faixas brancas do lado esquerdo e pequenas, simples sandálias azul-escuras nos pés. Em seu rosto jovem estava estampada uma expressão parada, através dos olhos verdes e dos lábios meio grandes. Seu nome era Daniel.

Bruno não sabia o que pensar da situação. Era incomum ele deixar seu descanso das tardes de domingo para bater perna com alguém, e ainda por cima com alguém como Daniel. Não eram exatamente amigos; faziam mais o tipo de se falar quando necessário e se dar bem à medida de quanto fosse preciso. E ele sabia muito bem porque não conseguia se sentir à vontade com ele, assim como outras pessoas que o conheciam. Daniel era incomum. E foi uma curiosidade estranha que havia despertado em Bruno no momento em que ele apareceu literalmente do nada à sua casa (não que tivesse vindo antes alguma vez na vida), dizendo que precisava dar uma volta com alguém, que fez com que Bruno cedesse seu descanso de feriado para ir sabe-se lá para onde com Daniel.

- Pra onde é que a gente tá indo, mesmo? – perguntou ele, tentando se livrar do sono de vinte minutos atrás.

- Um clube de esportes. Ali no final da rua. – Daniel respondeu, apontando. Para um garoto que parecia não ter crescido direito, tinha uma voz estranhamente grave e direta. Bruno lembrou como achava isso engraçado nas vezes em que falava com ele no colégio, enquanto olhava para o tal clube à distância. Até que caiu a ficha de uma coisa que apenas o sono podia ter feito ele esquecer, que todos sabiam.

- Cara... Não era você quem tinha ficado com a Taís, na qui-

Daniel suspirou, meio irritado.

- É. Fui eu, sim. Mas não quero ficar falando desse assunto hoje. – Bruno olhou sem entender. – Nos últimos dois dias todo mundo tem me perguntado sobre isso, e eu não aguento mais ficar repetindo. Já é chato demais ter que evitar ela.

- Hã? Como assim... – agora Bruno estava sinceramente confuso.

Daniel deu outro suspiro, impaciente.

- É que... – de repente ele tirou seu celular, que vibrava, do bolso da bermuda. Bruno continuava a olhar intrigado enquanto ele parecia ler uma mensagem, antes de entregar o celular a ele, com um olhar que dizia “olha o que você fez”, como se a mensagem fosse culpa de ficarem falando demais sobre a garota.

Bruno apanhou o celular e leu:

Daaaan :(
ja te liguei umas 20 vezs hojee e nada!
pq vc ta sumido assim? desde ontem n
consigo falar com vc :( me liga ta? bjs

Agora definitivamente Bruno não entendia mais nada. O fato é que todos sabiam como na última festinha, na quinta-feira, Daniel havia ficado com uma garota. O motivo de todos saberem, porém, era porque não era uma garota qualquer.

Taís do C era simplesmente aquilo lá em cima. Era um fato que não era a mais gostosa, porque haviam outras como Vivi, Gabriela ou Marina. Mas de alguma maneira Taís acabava sempre roubando a cena, como se houvesse um feitiço sobre suas feições de anjinho. Seja pelo jeito com que sabia mexer com os brios dos garotos como ninguém nas conversas, atrapalhar até mesmo um professor despreparado com seu sorriso inocente, e depois passar grande parte do tempo rindo e comentando com as outras. E era impressionante como parecia haver alguma pressão sobrenatural naquele leve corpinho moreno, sempre cheiroso e que atraía desde os mais confiantes até os mais tímidos.

O fato de Daniel haver conseguido algo (coisas até demais, diziam) com ela era algo sem precedentes, afinal, absolutamente ninguém ouvira falar de Taís ficar com alguém, ou pelo menos de isso se tornar conhecido no colégio, ou fora dele. E agora que o loirinho mirrado chegara aonde ninguém chegou, o que não devia ter faltado era gente querendo tirar os fatos a limpo (pensando assim, ele até entendia a revolta de Daniel por haver tocado no assunto revirado).

- Oi.

Acordando de seu devaneio, Bruno percebeu que ele havia ligado para ela, impassível, enquanto ele remoía os fatos. Os dois garotos continuaram a andar.

- Escuta... Taís. Taís.

Outro suspiro. Bruno imaginou o que ela estaria falando.

- Olha – a voz dele engrossou de novo, apesar de continuar caminhando tranquilamente, como se estivesse no lugar de Bruno -, eu não quero saber. Para de ficar me ligando, beleza? – outra pausa. – Não. Isso tá me incomodando bastante, entendeu? Me deixa em paz. NÃO! – ele ficou em silêncio alguns instantes, como que ouvindo a resposta, e desligou tranquilamente.

Bruno olhava, estupefato. Tinha acabado mesmo de presenciar um cara – um imbecil – dar um fora na menina que fazia a cabeça de todos?

- Mas – mas que porra foi essa?

- Talvez não faça parar de me encherem o saco com as perguntas – Daniel falou, passando a mão pelos cachos com um ar de alívio -, mas pelo menos ela vai parar de ficar atrás de mim. Ela é insuportável...

Sem palavras, Bruno contentou-se em ficar quieto e tentar entender em que merda ele estava pensando. Tinham chegado à entrada do clube.

- Eu nunca suportaria ficar andando com aquela garota – ele continuou calmamente, como se sentisse que devesse uma explicação. Nem lembro de como as coisas foram parar desse jeito. Sempre tive um tesão enorme pelo tipo dela, só isso. Ninguém se lembra de como ela gostava de humilhar as outras, no ano passado, nem de como passa o tempo falando merda de gente como eu e você. E nem de como aquele tal de Felipe levou a culpa toda daquela confusão em setembro, em que ela tava envolvida. – disse, enquanto passavam pela catraca da portaria do clube, surpreendentemente sem ninguém por perto.

- Mas – começou Bruno indignado.

- E você – cortou Daniel – esqueceu daquela vergonha de meses que passou por causa dela, quando resolveu falar que estava apaixonado. Mas nem são essas coisas que me irritam mesmo nela. Ela fala pra caralho.

Parado com a boca aberta, Bruno calou-se e entrou no clube atrás dele. De repente lembrou-se do porque Daniel ser incomum. O esquisito, às vezes grosso, às vezes bobo. Aquele que, como uma máquina, analisava friamente as coisas que lhe eram pertinentes. Aquele que sempre era bizarramente sincero e quieto, e tudo isso enquanto parecia estar alheio a tudo, como se não fosse com ele.

- Cara – ele riu, enquanto começavam a andar pelo clube, que certamente daria um descanso à chatice das perguntas dos outros a Daniel após a semana cansativa de colégio -, cê é muito doido. Sério.

Daniel fez um ar de riso pela primeira vez.

-Hm.

***

A casa era enorme, mas o jardim de trás era maior ainda. Uma árvore de média idade se erguia entre as plantas, e em meio da grama bem cuidada, lindas flores e arbustos, projetava a sombra de suas folhas para parte do jardim, e sobre uma bela rede azul-escura bordada com desenhos e amarrada em duas árvores menores, de tamanhos parecidos e engenhosamente plantadas. O jardim ficava dentro de uma grande área quadrada, separada por uma cerca de tijolos que alcançava algumas dezenas de centímetros acima do solo, e o separava do resto dos fundos da casa, com mesas e guarda-sóis perfeitos para churrascos com os vizinhos. Apenas a visão dos fundos da casa era capaz de intimidar qualquer um; era certo de que os habitantes viviam uma vida de classe alta.

Ali, em cima da rede, em meio às plantas e aos ocasionais beija-flores e abelhas e sob as sombras da árvore e dos altos muros das casas adjacentes, estava deitada uma bela adolescente, de pele rosada, como quem acaba de correr vários metros e fica com o rosto corado. Seu nariz fino chamava a atenção, assim como uma pinta escura na bochecha esquerda, e seus longos cabelos castanhos estavam soltos, caindo pela rede e pelo busto, razoavelmente ondulado. Visivelmente acabara de chegar em casa, pois ainda calçava os tênis brancos e as meias, além de uma calça jeans branca e comprida, justa às grossas coxas, e uma blusa azul, de tecido leve, sobre a qual pousava as mãos, em cima da barriga. O ar ao seu redor mantinha-se impregnado com o perfume chamativo da garota.

De olhos fechados, Marina apreciava o descanso no pedaço de natureza como se o nunca o tivesse feito, apesar de fazê-lo quase todos os dias. Um ruído que aumentava chegou a seus ouvidos. Abrindo os olhos, viu um avião cruzando o céu abaixo das densas nuvens, muito ao longe. A tranquilidade era palpável.

De repente, a dor.

Uma dor, não sabia exatamente onde, a alfinetava distantemente. Outra vez. Sempre a sentia quando estava em momentos de extrema paz. Era como se houvesse esquecido de algo importante, algo que deveria estar fazendo. A tranquilidade... não era... certo...

E então a sensação se foi, como todas as outras vezes, deixando uma sensação de algo perdido na mente, reminiscente a um deja vu, porém claramente diferente; e no olhar vago de Marina, que se levantara e agora mirava vagamente em frente.

- Má?

Mirtes, a cozinheira, estava na porta dos fundos da casa, além do murinho de tijolos, com o cabelo preso e o sorriso gentil de sempre no rosto negro que se aproximava das rugas da velhice. Marina pisou no chão de grama, voltando à realidade, e foi ao encontro dela.

- Por que demorou tanto? Pelo menos almoçou bem?

- Claro, Mirtes. – ela respondeu, rindo. – A Gabi fez questão de fazer um almoço enorme pra todo mundo que foi no aniversário. Mas eu dei um jeito de pagar a minha parte lá com o dono do restaurante. – contou ela desviando o olhar enquanto ria baixinho.

Mirtes balançou a cabeça com um muxoxo. Às vezes se perguntava como ela não era roubada todos os dias, com tanta inocência.

- E a festa é de noite, né?

- Sim.

- Hum... sua mãe tá lá em cima. – falou Mirtes apontando com o polegar para o casarão. – Porque não passa o resto da tarde com ela? Eu tenho bastante trabalho a fazer.

Marina murmurou algo inintelingível antes de se abaixar para receber um beijo na testa da negra.



O pequeno apartamento iluminou-se quando um jovem entrou, antes de acender as luzes e fechar a porta. Caminhando brevemente em direção ao quarto, ele jogou-se na cama e olhou para o teto, quente e um pouco afobado como resultado de andar na rua. Mas tudo isso sumiu quando ele começou a contemplar o teto, com a mente vazia.

***

Era como se estivesse ali o tempo todo, e só percebera agora.

Tudo o que ele via a seu redor era um ofuscante branco, tão intenso que engolia até mesmo o que ele tentasse pensar, e o distraía, de forma que não era possível bloquear a poderosa luz. E não poderia bloquear nem que quisesse, afinal, ele não tinha pálpebras – ou olhos. De fato, o ser que acabava de acordar não tinha sequer algo que parecesse com um corpo, e flutuava inconsistente na forma de uma massa estranha, fragmentada em formatos e consistências aleatórios, e dentro da redoma talvez pequena, talvez gigantesca, preenchida – preenchida? - de luz.

Gradualmente, a sensação de queimação extrema tomou conta de seus sentidos. Era como se estivesse fervendo e sendo mexido no meio do ar. Teve vontade de gritar, mas não conseguia sentir nada além da dor, uma dor quente, como que misturando, juntando e remontando as partes flutuantes. Quando o medo do desconhecido chegou ao ápice, e ele desejou furiosamente saber onde estava – quem era – e por que doía tanto, tudo literalmente congelou.

Um frio capaz de cortar o próprio ar se instalou na redoma, e o brilho outrora incrivelmente ofuscante começou a diminuir. Com uma sensação irresistível de alívio e tranquilidade, o corpo dele caiu, fazendo um ruído no fundo da redoma – pois agora ele tinha um corpo, após ser “fervido, misturado e congelado”, um pequeno corpo esverdeado, com cabelo, olhos e membros, completo.

Com o resto de suas forças, Kaoru levantou a cabeça para olhar além da redoma, que agora desaparecera e não era mais que uma imagem queimada em sua memória ocular. Mas antes de poder registrar algo mais do que as coisas que aparentemente eram redomas similares à que estava, que faziam um círculo em volta do lugar, ele perdeu a consciência e todas as perguntas morreram.

***

O sonho estava tomando um rumo estranho, e ela percebeu que poderia fazer as coisas conforme a sua vontade. Era divertido. Mas gradualmente, começou a ficar difícil de enxergar as coisas do sonho. Seus olhos estavam fechados e ela escutava os ruídos de um lugar parado. Mas não era importante... Tentou focar-se no sonho.
Um barulho irritante e alto cortou o ar de calmaria do quarto.

Um despertador antigo tocava alto seu alarme, forçando Priscila a desistir do sonho para apertar o botão. Ela tentou fechar os olhos novamente, mas era inútil. Olhou para o relógio digital do despertador, e o horário não era uma surpresa: 15:27. Domingo... O que seria de sua vida louca sem eles.

Um som em outra parte da casa a despertou de seu transe: Não podia deixar que as chances de o que soava como “Priscila!! Vem cá, criatura!” serem realmente o que parecia fossem reais. Tomar banho – talvez dar uma fugida de casa... De um salto, ela pulou da cama e ficou em pé, mas no momento em que fez isso, sentiu uma terrível tontura e um ofuscamento nos olhos, parecido com cegueira, por alguns instantes. Talvez – com certeza –, ela notou, sentando de novo na cama, bebera demais...

Priscila era um pouco baixinha para a idade. Tinha cabelos cor de mel, iguais aos olhos, e por cima das feições arredondadas do rosto, estava sempre com uma franja em cima de algum olho; e seus olhos estavam agora intrigados a respeito de como diabos ela conseguiu vestir aquele pijama amarelo antes de cair na cama, do jeito que estava ontem. Resolveu deixar esse enigma para depois, e atravessou rapidamente o pequeno e bagunçado quarto, desviando das coisas no chão.

Quinze minutos depois, com as olheiras da ressaca que o banho não conseguiu tirar (além de uma teimosa dor de cabeça que a martelava), vestindo uma camiseta rosa e um short azul-claro meio folgado, a loira cuidadosamente olhava para fora do corredor, na direção da cozinha. Ninguém à vista, e um som de televisão podia ser ouvido na sala, que era o único caminho para sair de casa. Não só o seu quarto nos fundos, mas toda a casa parecia ser bagunçada, de forma que parecia que alguém muito apressado e sem organização estava de mudança repentina. As coisas das crianças estavam sempre espalhadas pelo chão, enquanto elas dormiam em um quarto embaladas ao som de um filme qualquer na outra televisão (pelo que ela conseguiu entender, enquanto espiava ao passar pelo corredor).

Atenta a qualquer movimento que pudesse ser de sua mãe, ela atravessou a cozinha, que era pequena como todos os outros cômodos, silenciosa como uma sombra. A meio caminho ela distraiu-se, vendo uma embalagem de salgadinho pela metade, e enfiou uma meia dúzia deles na boca rapidamente. Olhando atentamente dentro do saco prateado, viu uma tatuagem barata, do tipo que dão para crianças. Sem pensar duas vezes, grudou o papelzinho com a imagem tribal no abdômem, rindo baixinho. Continuou o caminho em silêncio.

Ao chegar à sala, sentiu um certo alívio. Quem estava esparramado no sofá era o seu primo chato, Felipe. Pelo menos sua mãe realmente não parecia estar por perto; tinha esperanças de que não estivesse em casa.

- Hm? Acordou agora? – o sardento resmungou com tom de deboche em sua voz de preguiça, desviando o olhar da televisão e aprumando-se no sofá. – Melhor correr antes que minha tia te pegue. Eu sei da história, hein. – ele riu. Felipe era perigoso, gostava de entregar Priscila para a mãe só para ver ela se dar mal. Se ele já havia contado a história ou não, era um mistério.

Mas a porta que dava para a rua estava bem em frente, e Priscila não resistiu. Ele não a conseguiria alcançar mesmo, era um preguiçoso com cara de sono que nunca devia ter corrido na vida. De um salto, ela atravessou a sala e abriu a porta, e avistou o muro de casa. Dorzinhas de cabeça não a impediam de ser rápida. Só que então...

Uma dor repentina apareceu em sua orelha, quando ela se preparava para correr. Sua mãe, que sem dúvida ficara esperando do lado de fora, era quem a estava puxando, como se faz com crianças. E não parecia nada satisfeita.

- MENINA! – berrou ela, a arrastando consigo para dentro de casa novamente.

- Que foi, mãe? Me solta – ela tentou fazer uma cara de desentendida enquanto tentava se desvencilhar devagar.

- Nem vem com essa pra cima de mim! – sua mãe bradou, enquanto olhava para Felipe. O safado fingia ignorar a situação, enquanto assistia televisão casualmente. Agora Priscila tinha certeza que ele tinha tomado parte, fazendo a tia esperar do lado de fora enquanto Priscila caía direitinho...

- Cê acha que te botei de castigo por que, peste? – ela esbravejou, largando a orelha. – Além de fugir do castigo saindo ontem de noite, ainda me rouba o último dinheiro que eu tinha pras compras dessa semana! Tu vai pro teu quarto e só sai na hora da escola agora!

- Ah, dá um tempo. – Priscila respondeu cautelosamente, porém ainda fazendo pouco, enquanto esfregava a orelha agora vermelha. – Tenho dezesseis, idade suficiente...

Felipe riu pelo nariz.

- ...pra ser irresponsável e não ter que responder por nada – ela finalizou rindo, calculando bem o risco do deboche.
Dona Regina fez um gesto vago de alguém que vai dar um tapa maternal, mas muda de ideia no meio do trajeto. E Priscila sabia como isso nunca acontecia mesmo.

Regina era uma senhora iniciando nos quarenta, com um rosto nas portas da idade avançada, grandes olhos castanhos penetrantes e um cabelo escuro e curto, beirando os ombros. Sua expressão de repente adotou um tom mais manso.

- Sua tia vai me cobrar aquele dinheiro de antes... – sua voz agora era bem mais baixa e um pouco abalada, como se falasse sozinha. – A gente nunca t-

Em uma fração de segundo, Priscila mandou às favas o primo traíra que descobrira sobre ela ter fugido de noite para a festa e ter ficado lá durante toda a madrugada, sabe-se lá onde, com quem e fazendo o quê, além de ter roubado o dinheiro importante, em uma casa onde todo dinheiro era muito. Deixou Felipe pensar o que bem entendesse e abraçou, naquela fração de segundo, sua mãe.

- Eu fiz de novo.

Era um murmúrio, um pedido de desculpas silencioso de alguém que sabia que não merecia tais desculpas, e parecia querer consertar de alguma maneira. Tão rápido como começou, o abraço se desfez, e Priscila voltou rapidamente para a cozinha, sem dar atenção a Felipe, que com certeza estava impressionado com a cena.

Era sempre assim, um ciclo a repetir-se. Ela nunca conseguia segurar seus impulsos; jamais deixava passar qualquer oportunidade que lhe apetecesse, desde nova. Quando sentia gula por um lanche qualquer, dava um jeito de comer o que não lhe pertencia. Se via ou imaginava uma maneira de se divertir ou tirar proveito de algo, levava na brincadeira e se jogava na diversão iminente. Procurava sempre aproveitar cada momento cegamente, e fazia loucuras. E no momento estava incomodada por não conseguir se arrepender sinceramente.

Regina continou parada, observando a filha tirar o plástico da tatuagem barata, já formada na barriga, e pela enésima vez esqueceu de julgá-la enquanto a observava com amor nos olhos.

***

A sala do reitor era simples, porém aconchegante. Não muito maior que uma sala de estar comum, detinha uma escrivaninha, uma poltrona pequena porém confortável atrás, e duas cadeiras na frente; uma estante sem graça, mas com uma quantidade considerável de livros enfileirados; e uma janela de vidro relativamente ampla, que exibia a visão monótona de uma área qualquer do campus. O próprio reitor tinha um olhar complacente e despreocupado, cabelo castanho começando a rarear acima da testa e a ganhar fios brancos aqui e ali, enquanto sua boca de lábios finos era um pouco cômica, especialmente com seus sorrisos de canto que surgiam na conversa. Seus óculos tinham aros um pouco grandes. Vestia roupas casuais; parecia à vontde.

Sentado em uma das cadeiras estava um rapaz adulto de enorme presença. Era moreno, de cor tão escura que à distância parecia quase negro; a cor de sua pele causava um agradável contraste com a camisa social roxa. Tinha olhos negros expressivos e brilhantes, e seus dentes brancos tiravam a atenção do rosto completamente liso cada vez que sorria. Seus braços musculosos, mas não exageradamente, tinham as mãos descansadas no colo. Estava bem arrumado, de calça jeans comprida e tênis.

- ...mas sabe, filho, eu não posso arranjar as coisas por aqui sempre que quero. É bem difícil...

- Eu sei como deve ser. Pelo menos tento imaginar – riu o rapaz; sua voz era gentil e tinha um eco de inocência; tinha um olhar complacente. Qualquer pessoa se sentiria à vontade perto de alguém como ele.

- Mas então, Marcos, o que você queria pedir?

- É que eu tô sentindo muita dificuldade na matéria do professor Carlos... – ele coçou a cabeça enquanto ria, parecia uma criança envergonhada. De fato, a matéria de Carlos estava dando bastante trabalho a ele.

- Hm...

- Eu vi que semana que vem vai ter aulas extras com a Márcia... Mas ninguém ficou animado, tá todo mundo preocupado com o teste do Carlos que tá chegando por aí. Acho que não vai dar ninguém nessas aulas... Muita gente vai tar ocupada. – E ele lançou um olhar irresistível, como se pudesse mexer na vontade do reitor.

Era mentira. Todos estavam aliviados com a notícia das aulas extras de Márcia; provavelmente ninguém faltaria. Mas Marcos havia conseguido um bom desempenho na matéria problemática, apesar de estar quebrando a cabeça nas aulas de Carlos, com as quais ironicamente nem todos tinham dificuldade.

- Bem... eu tinha ouvido que era bem o contrário disso... – por trás dos óculos, o reitor estudou discretamente, mas atentamente, as feições de Marcos.

- Eu também achava que as coisas estavam ao contrário disso. Todo mundo... há algumas semanas. Mas agora tá tudo muito diferente, senhor. Depois que ele começou a...

Tudo mentira. E só quem ganharia com isso seria Marcos, às custas de muitos.

- Entendo. Se é assim, terei uma conversa com eles. Não se preocupe, sei que você veio aqui preocupado com a situação das turmas. – os olhos do reitor brilharam sinceramente. – Você é um bom menino... vi seus boletins, sabe. Notas excelentes... E há algumas semanas, quando me encontrei com sua família, soube de seus sucessos... Natação, karate, inglês... Você é muito esforçado, rapaz.

Marcos fingiu se envergonhar; um fingimento perfeito e impecável.

- Falando assim parece até que... – coçou a cabeça de novo. O brilho dourado de um anel em sua mão apareceu ao fazê-lo.

- Mas é verdade, não? – gargalhou o homem. – Fique tranquilo, vai se dar bem.

- Obrigado, senhor. – ele falou se levantando, ainda fingindo uma leve vergonha ao sair. – Nos vemos.

Ele acenou da cadeira.

Fechando a porta da sala, Marcos suspirou. Não por alívio de estar anteriormente nervoso, mas por finalmente se livrar do cheiro estranho e incômodo que cercava o homem. Geralmente todos torciam o nariz e falavam meio atravessado ao passar pelo reitor, mas Marcos acabara de sorrir e conversar simpaticamente com perfeição com ele. Com certeza, ele pensou em vitória por dentro, havia atingido algum lugar no psicológico do homem com sua boa vontade e gentileza. Ele sempre sabia como atingir as pessoas.

- E então, cara? O que ele falou? – era seu colega de turma, Fábio. Estivera esperando-o do lado de fora da sala, ansioso pelos resultados da conversa.

- Tudo ótimo! – Marcos deu um sorriso vibrante e confiante, completamente falso. – Ele vai ver como mudar os horários o mais rápido possível. Boas chances, cara.

- Ainda bem! – disse Fábio socando o ar em comemoração silenciosa. – Não ia ter como eu chegar às três da tarde, do jeito que as coisas estão em casa...

Fábio precisava urgentemente de reforço na matéria de Márcia, assim como muitos. Estivera desesperado, em contraste à felicidade dos alunos em geral, ao ver o horário das aulas extra, e havia pedido a ajuda de Marcos para conversar com o reitor sobre as aulas.

- Tá tranquilo agora, né? Vamo no bar no Maneco descansar saindo daqui?

- Claro... agora tá mais fácil de descansar...

Marcos realmente precisava tirar um tempo para descansar e tomar uma. E estava ciente que simultaneamente iria destruir o tempo que Fábio usaria para revisar a matéria quando chegasse em casa, por o colega não saber beber com moderação e ficar doidão pelo resto da noite. Mas isso não o incomodava em sua consciência. Precisava ir ao bar com ele, e pronto. Os problemas do outro eram irrelevantes.

- Vou no banheiro, pera. Vai indo na frente. – falou Marcos ao começarem a andar pelo corredor.
Havia agido, mais uma vez, pelos seus objetivos. Ele desejava o sucesso. Seus objetivos...

***

Seus objetivos...

Uma figura, segurando duas esferas cegantemente brilhantes, só pensava em seus objetivos.

***

Jogando água fria no rosto, Marcos levantou a cabeça e olhou-se no espelho. Friamente, contemplou seu próprio rosto e sua beleza auto-proclamada. Seus negros olhos miravam firmemente... Não se abalavam mesmo após ter acabado de fazer algo perturbador com os outros.

Ele acariciou, por hábito, o anel em seu dedo com a água da torneira, e saiu do banheiro.

- Opa! ...oi, Marcos!

Michele, a garota jovem da sala sempre próxima a sua. Era baixinha, e suas tranças eram no mínimo diferentes. Sempre usava saias longas, como se estivesse a caminho da igreja ou algo assim. Marcos sabia como ela tinha um fraco por ele, mas para ele ela não era nada de mais.

- Desculpa! Tudo bem? – ele sorriu simpaticamente, sem exagero, ao pegar do chão os cadernos que ela deixara cair, e os entregando em seguida.

- Tudo, e com você? – o que era isso? Ele percebeu imediatamente que esta não era a Michele de sempre. Havia uma certa firmeza na garota aérea que ria de tudo que ele falava... Antes que ele pudesse responder com um jovial “Tudo ótimo”, ela de repente o empurrou levemente para a parede, e falou. – Na verdade... Eu queria te perguntar uma coisa...

Isso era ruim, ele pensou. Se a gostosa religiosa que fazia Letras o visse, suas chances de qualquer coisa iriam por água abaixo. Lentamente, ele afastou as mãos dela sem parecer grosseiro, apesar de olhar rapidamente para o fim do corredor onde Fábio há muito desaparecera.

- O quê?

- Cê acha que o Fábio fica comigo?

Hm... Estranho. Menos mal.

- Não conheço ele direito... Mas acho que sim. Que pergunta, hein?

- Brigada. ‘té amanhã. – e se afastou.

Então devia ser isso... Pelo jeito bravo com que ela o olhou e o empurrou, o mais provável era que Michele tinha desistido dele, e começado a pensar naquele que andava junto dele, Fábio. E se sentia com uma certa raiva por haver pensado em Marcos por qualquer razão, mas agora era capaz de encará-lo e falar com ele. Marcos tinha certeza da hipótese, sua análise do que os outros pensavam era algo sobrenatural; facilmente deduzia as razões das ações das pessoas.

- Até que enfim.

Fábio estivera esperando ele no portão; aparentemente demorara demais no banheiro. Já na rua, caminharam juntos a destinando-se ao bar próximo.

- Marcos...

- Hm?

- Cê que é amigo da Rafaela...

- Que é que tem?

- Eu tô pensando nela essa semana toda. Acho que vou tentar algo amanhã. Que cê acha?

Marcos deixou escapar uma risada do fundo de sua consciência para a voz.

- Qual a graça?

- Nada, lembrei de algo engraçado. – era cômico, de fato, como virara cupido de repente e poderia interferir em algo tão sutil... Só por diversão, resolveu atrapalhar a intenção da garota que acabara de falar com ele. – Acho que deve, sim. Ela gosta de firmeza; acho bom você não andar ficando com ninguém até conseguir algo. – ele respondeu, tentando manter o riso malvado.

Manipular era uma dádiva maravilhosa. Era preciso, e às vezes era uma diversão. E ele vivia dentro disso.

***

Sozinho no banheiro simples do clube, Daniel tirou a camiseta descansadamente enquanto observava seu corpo, peito infantil e fino, e braços compridos demais apesar de magros, no espelho. Estava a caminho de sair, já com a grande piscina em vista quando desmaiou.

Pelo menos parecia um desmaio iminente, mas pareceu recobrar-se em uma fração de segundo. Completamente confuso, perguntou-se o que seria quando aconteceu de novo. Lentamente, como uma bizarra pulsação alheia que se infiltrava em seus sentidos e sua própria pulsação, ele sentia a sensação similar a desmaio repetidamente, sua visão piscava intermitente entre escuridão e o lugar onde estava, e começou a cair ao chão de azulejos.

A sensação de espasmos perturbadores se intensificou e ficou com intervalos cada vez menores. Inerte, quando estava em convulsões ao chão e sem voz, Daniel finalmente apagou quando os intervalos sumiram e só o que ficou foi a sensação catastrófica que se apoderava de seu corpo.

***

Luz atravessava suas pálpebras.

Após vários segundos de estagnação, ele abriu os olhos. Tudo era cinza, e a confusão começou a se realizar em sua mente. Baixando a visão enquanto percebia que estava deitado, ele foi percebendo pouco a pouco as dimensões do lugar em que se encontrava. Pareciam árvores e grama... Mas o mais chocante era que tudo não passava de cinza, em vários tons.

Enquanto ainda estava abobado, um flash súbito passou em sua visão, trazendo cor a tudo por alguns segundos e então esvaindo-se, com tudo voltando ao cinza novamente. O choque não foi o suficiente para fazê-lo levantar-se, mas ajudou a diminuir a lerdeza inata da situação.

Ficou parado, sentado ali e girando a cabeça ao redor para observar o lugar, sem saber o que pensar; e então a cor voltou e sumiu de novo. Resolveu esperar que isso continuasse a se repetir, e não deu outra. Após alguns minutos, sua visão estava definitivamente colorida, apesar que entrava e saía do cinza quando chegava perto de piscar. Começou a entrar em certo desespero ao se perguntar o que isso na sua visão significava, além do lugar estranho em que estava.

Seus olhos bateram em algo no chão próximo que fez seu coração disparar. Não podia ser... Não tinha como... Esquecendo todas as dúvidas, ele ficou de pé para se certificar de que não estava delirando, apesar de todas as provas anteriores de que deveria estar.

Seus olhos confirmaram o tão inacreditável quanto todo o resto, porém muito mais interessante: com o coração acelerado, ele constatou a garota incosciente, bela e inerte na grama, com a blusa aberta e os seios quase aparecendo por debaixo do sutiã exposto à luz do sol.

Rodrigo se perguntou se algum dia em sua vida parada conseguiria processar todos esses absurdos.

***

Fazia no mínimo cinco minutos que Daniel atravessava as plantas, vestindo apenas a bermuda e com os olhos injetados, como quem está à beira de um surto psicótico. Já não sendo normal, isso não era questionável à luz da situação sem sentido e louca em que se encontrava.

Ele era objetivo. Ele encontrava a solução imediatamente, e friamente tomava as decisões e posicionava suas opiniões. E agora por estar jogado em algo sem explicação e desesperador, estava à beira de perder a razão. Havia acordado neste lugar absolutamente desconhecido e sem precedentes. Raptado? Sequestrado? Jamais duvidara de qualquer teoria mirabolante que os outros inventassem. Um planeta distante. Alienígenas. Realidade superior. Tudo passava como um furacão em sua mente, e ele pelo hábito que lhe era próprio, frustrava-se nervosamente a tentar descobrir uma solução para suas dúvidas. Agora andava sem rumo, como um robô, marchando por entre as árvores e arbustos desconhecidos, esperando que a resposta aparecesse por milagre.

Um brilho à frente. Água. O mar! Era um lago. Suas águas escuras e onduladas estendiam-se longamente até onde pôde divisar a distante margem. Lembrou-se da piscina que mirou no clube. A semelhança o atingiu como se a piscina o tivesse traído por haver se transformado no escuro lago. O céu do clube também o havia traído. A razão começava a fugir de Daniel... Estava a momentos de passar mal seriamente. Antes que pudesse perceber, já estava na beira do enorme lago.

Mirando a água escura, a razão foi-se completamente, e ele começou a sentir diversas emoções. Medo. Desespero. Confusão. Pela primeira vez desde que tornou-se gente, Daniel sentiu emoções de fato, e as emoções eram dolorosas. Começou a sentir ódio também.

Um som chegou a seus ouvidos. Estivera agachado, com o rosto enterrado na grama rasa da beira do lago, quando ouviu aquele som. Parecia um deslocamento de água; ele não estava em condições de compreender nem mesmo sons brutos. Sem pensar, com pura curiosidade pela primeira vez em sua vida, ele levantou a cabeça rapidamente para encarar a origem do som. Desejou não tê-lo feito.

A cinco metros do nível da água do lago, erguia-se uma forma que parecia haver sido implantada nos olhos de Daniel, tão surreal e inacreditável que era. O medo implantou-se completamente em seu corpo, pela primeira e mais violenta vez.

A figura começava grossa como o tronco de uma colossal árvore, que grotescamente ia se desdobrando para fora da água, e sua cor era de um branco escamoso juntamente de um vermelho felpudo e peludo, rajado de verde. Os olhos do adolescente acompanharam vidrados enquanto iam subindo pelo corpo de seja lá o que fosse aquilo que surgira. Incontáveis membros semelhantes a nadadeiras estavam espalhados aos montes pelo corpo gigantesco. Ao topo da forma enorme que parecia firme, mas ia desenrolando-se de um forma que deu arrepios em todo o corpo de Daniel, estava uma horrível cabeça, que possuía um capacete amarelo brilhante pontudo, com um chifre literalmente em forma de raio que se projetava para fora do crânio. Para completar a visão, havia uma boca deformada, cuja repulsiva gengiva e músculos estavam expostos, em que caberiam dezenas de pessoas, com uma língua saltada e grossa que mexia-se lentamente, como uma cobra ameaçadora e espantosamente vermelha. A criatura mantinha seus enormes olhos azuis, de pupilas verticais, intensamente fixos em Daniel, que parecia já haver morrido.


Última edição por Gol D. Roger em Sáb Nov 17, 2012 11:30 am, editado 4 vez(es)
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Mensagem por Takuya Qua Out 03, 2012 11:20 am

Você escreve bem! Gostei da forma como estruturou a fic, tipo um livro, com prólogo, capítulos, tudo mais, fica bem mais de acompanhar assim. Não vi erros de gramática, o texto ta bem limpo, fácil de compreender. A narrativa flui bem também. Quando eu estiver com menos calor dou uma lida mais atenta e comento sobre a história, continue postando, tem muita gente que lê mas não comenta xD
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Mensagem por Gol D. Roger Qua Out 03, 2012 3:22 pm

Obrigado por comentar, continuarei postando sim. Hoje eu tava pensando e tem como eu fazer um capítulo em dois ou três dias, MAS se juntar a preguiça na fórmula dá uma semana ou mais pra escrever. ._.

Quando a internet cai eu produzo muito mais HEUHEUHE #Fato


Última edição por Gol D. Roger em Sáb Nov 17, 2012 11:30 am, editado 1 vez(es)
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Mensagem por Rayana Qua Nov 07, 2012 6:55 am

Depois de algum tempo consegui ler finalmente. xD
O Takuya já o tinha dito e acho que não adianta repetir, mas em relação à escrita eu gostei - mesmo parecendo-me excessivamente densa e misteriosa em alguns pontos. Calculo que no futuro essas partes fiquem mais claras, mas por enquanto não me fazem muito sentido ainda, então não as posso comentar com justiça.

Esboçaste o perfil de vários personagens aqui, colocando-os em situações mais ou menos engraçadas, mais ou menos corriqueiras, mas essencialmente sempre algo misteriosas. Ao acabar de ler, aquele que me ficou retido na memória foi o Daniel. Ri-me da forma como ele decidiu sair para a rua com companhia, do nada. xD Chamou a atenção. E parece-me um personagem com uma franqueza e honestidade quase obscenas - foi uma coisa que gostei.

Temos por outro lado, temos esse tal Marcos... que até ver, tem o perfil de um sociopata consciente. Talvez uma espécie de marioneta de alguém, ou simplesmente ele é assim... não sei. Mas fiquei curiosa em relação ao papel dele na história.

A Priscila... parece-me a mais normal do elenco, só por enquanto. Atrevida, quebra-regras, talvez algo mimada, mas em essência, não fora dos padrões "normais" de uma adolescente.

Então, fico no aguardo por mais! \o/ Continua!!
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Mensagem por Gol D. Roger Qui Nov 08, 2012 7:15 am

Obrigado por ler!

É, em quase todas as partes ficou com esse ar - mesmo realmente tendo um motivo por trás, geralmente eu gosto de fazer dessa maneira misteriosa até sem motivo algum. É um hábito não exatamente perfeito de tentar mostrar drama em qualquer tipo de situação.

Espero que as situações tenham ficado curiosas. xD Resolvi pensar um pouco mais nas coisas sem importância que estariam acontecendo no capítulo e deixá-las um pouquinho mais agitadas, só um pouquinho de nada, porque é frustrante o jeito que várias fics começam: protagonista acordando, levantando da cama, falando com a mãe e indo pra escola, encontrando os outros dois personagens que obviamente terão relevância, fazendo alguma coisa trivial e finalmente indo à DW ou achando um Digitama. É incrível como eu consegui achar dezenas de fics que parecem ter sido copiadas umas das outras por começarem assim. Sei que a minha não tá tão diferente, mas pelo menos eu tentei fazer de um jeito um tiquinho diferente.

A ideia geral por trás do personagem de Daniel é essa mesmo: estranho, incomum, e que fica na memória das pessoas sem querer. Honesto, não por prezar a justiça e nem por venerar a verdade, mas sim por simplesmente estar julgando tudo como se não estivesse ali - como se as coisas não lhe dissessem respeito. Obviamente algum problema ele tem de ter. xD Ops...

Marcos realmente é o que tem o pior tipo de visão das pessoas... Acaba encontrando prazer no fato de poder ver os divertidos resultados, inúteis ou não para ele, que pode fazer acontecer ao manipulá-las de maneiras diferentes. E Priscila de fato é uma das mais comuns, não tem toda uma história nem uma lição de moral por trás, é do tipo que será marcada mais pela irreverência e como Daniel, por algumas atitudes inesperadas.

Mais uma vez obrigado por ler!


Última edição por Gol D. Roger em Sáb Nov 17, 2012 11:29 am, editado 1 vez(es)
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Mensagem por Gol D. Roger Qui Nov 15, 2012 4:08 pm

Shitsure... *double post dentro das regras*

Finalmente terminei essa porra, depois de enrolar até não mais poder. O engraçado é que eu demorei quase dois meses pra terminar, sendo que escrevi praticamente tudo nesses últimos dois DIAS. Lol... Estava lendo a Digimon Fate pela primeira vez e reparei que os capítulos lá são enormes e ninguém reclama consegui uma inspiração e vontade bem maiores ao ler algo de uma pessoa com um objetivo parecido.

Queria dizer algumas coisas...

>Vocês vão me achar tarado por algumas (muitas) coisas que escrevi. Estão certos.

>Alguns talvez podem achar que exagerei demais no drama em certas partes. Mas parem pra pensar e com certeza verão que é exatamente o drama que aconteceria conosco, se fôssemos nós na situação lá. Anime de Digimon tem o drama falho e ausente, e acaba fazendo o fandom pensar que fic normal é fic sem drama.

>Ficou grande, é verdade, mas se pensar que eu planejava a princípio colocar o segundo E o terceiro capítulos juntos nesse em relação às coisas que iriam acontecer (ficaria insuportável, iria alcançar umas 35 páginas), até que não tá tão grande.

>Espero que achem as situações e as personalidades dos personagens criativos. Apesar de ser uma história tão clichê de certo modo, me esforcei pra tirar os clichês dos diálogos e das situações.

>Tentei revisar um pouco, mas fiquei com preguiça.

>Quem comentar ganha um biscoito.

Comentem, digam se tem algum deslize, se tá tenso, se tá bom, essas besteiras assim. Nem que seja pra me trollar.

Saga I: Abdução

Capítulo II: Vaniur


[ Este lugar é um mundo totalmente diferente (...)
Wired Life
Meisa Kuroki ]

De longe, parecia apenas uma massa compacta de árvores cortada por um curso d’água, que seguia reto na maioria do trajeto, com leves curvas aqui e ali. Mas ao olhar com atenção, ficava explícita a bizarrice que era o conjunto de plantas que formavam aquele bioma sem precedentes. Continha altos pinheiros escuros que se erguiam para fora do mar de folhas, disputando altura com grossos carvalhos e mangueiras de copas largas. À sombra, era possível ver os arbustos rasteiros e densos, com espinhos secos, e sentir a fresca água que escorria das folhas de árvores próprias de florestas tropicais. O matagal sem nexo tinha clareiras aleatórias que ocorriam com frequência entre as árvores, e estendia-se por um bom pedaço. À distância, era possível notar a forma massiva de uma pequena montanha, da qual o rio aparentemente se afastava.

O céu pelo qual a mata era iluminada brilhava em um azul puro com raros fiapos de nuvens, e exibia um sol ofuscante que se erguia a certo ângulo, quase a pino. O céu também tinha suas estranhezas que poderiam ser notadas caso observado por um certo tempo, como os pontos brilhantes que apareciam repentinamente, semelhantes a estrelas diurnas, e uma ocasional “tremida” no azul da abóbada, como um pano balançado ao vento, exibindo inúmeras e minúsculas linhas cruzadas entre si em um pequeno espaço longe e indistinguível do resto do céu pela cor, que sumiam depois de alguns segundos para reaparecer em outro ponto.

No topo de um dos maiores pinheiros do matagal, estava uma criatura que destoava ainda mais gritantemente do ambiente, e chamava a atenção discretamente como um ponto azul-escuro agarrado à alta árvore, parado. Seus movimentos eram extremamente limitados, como se temesse estar sendo observado e atingido.

A princípio, era um ser de aparência reptiliana e selvagem, mas esta impressão era completamente quebrada pelas roupas – roupas – que o lagarto usava. Por cima de uma pele que era escamosa, mas tinha como verdadeiro chamativo a coloração quadriculada s como a tintura de um soldado em missão (com tons azul-claro e azul-escuro), o réptil vestia um grosso colete escuro, feito de couro no tronco e de material metálico nos membros, no capacete e na longa cauda. Apertadas com negros cintos de fivelas brilhantes, suas luvas cobriam completamente suas garras com três dedos cada, deixando apenas as alarmantemente enormes unhas expostas.

A cor principal da criatura era um misto do azul claro e escuro da tintura em suas escamas, cujos pequenos quadrados variavam em razão de tamanho entre si, com o verde-escuro da mochila de aparência metálica que carregava nas costas, e duas boias amarelas em forma portátil e reduzida que eram presas a seus cotovelos. Debaixo do capacete, ligado a tubos mais grossos que artérias a seu colete, sua cabeça comprida aparecia, com afiados dentes e uma viva língua na boca que abria raramente para respirar melhor no alto da árvore. Seus olhos grandes e amarelos apareciam por um buraco numa máscara de couro, colada às escamas quadriculadas, que cobria menos de metade de seu rosto. No final de seu crânio alongado, um par de narinas longas e finas ficava na ponta do focinho alongado.

O lagarto militar superdesenvolvido já estava parado deste jeito há bem uns dez minutos, com uma mão e uma perna o sustentando firmemente aos galhos do pinheiro, de forma que não parecia ser muito cansativo. Olhando sempre para baixo, ele atentamente esperava, movendo os grandes olhos brilhantes de clareira em clareira, como se prestasse atenção em algo que poderia aparecer a qualquer momento na floresta abaixo.

Os minutos se arrastavam. Se fosse de sua natureza, o monstro estaria suando de ansiedade. Por que esperar escondido, no topo de uma árvore, com uma camuflagem que destoava facilmente do forte verde escuro das folhas finas e pontudas? Ele não sabia exatamente a razão de não ter coragem para descer e procurar o que quer que fosse, mas esse pensamento o deixava desconfortável. Mas isso era redundante, afinal, a própria missão em si o incomodava profundamente. Ali em cima era silencioso e pacífico, tudo o que se podia ouvir era um vago murmúrio do curso do rio abaixo. Se tivesse como, ele gostaria de passar todo o seu tempo ali, sem precisar ir ao encontro do que o esperava...

Um som se fez ouvir na mata. Era uma voz feminina, que gritava sem medo e animada, mas que deixava um certo ar tremido, como se houvesse uma insegurança seguida pelo silêncio. A desconhecida gritava de intervalo em intervalo, e o levíssimo tom de desespero ia subindo sorrateiramente a cada chamada. O réptil no topo do pinheiro sabia o que deveria ser, tinha certeza de que era isso. Após hesitar por alguns segundos, ele foi saltando silenciosamente pelos galhos sólidos da planta, se aproximando das árvores menores e do chão. Quando se aproximou das copas de árvores em contraste da mata, conseguiu identificar a fonte do som.

Tomando a decisão de segui-la por enquanto, como que adiando o encontro que temia, ele a manteve à vista enquanto pulava de galho em galho, sem fazer ruído.

***

A luz machucou a visão de Marina quando ela acordou. A princípio era apenas um sol forte, que lhe doeu os olhos e a fez fechá-los instintivamente. Seu corpo estava mole e não respondia imediatamente, mas ela foi baixando a cabeça, cega, até abrir os olhos de novo e tentar observar seus arredores ao sentir-se mais confortável. Era surpreendente.

Tudo à sua volta, desde a mistura exótica e sem sentido de plantas até o céu fortemente brilhante da clareira era cinza. As cores que deveriam estar nas plantas do cenário não eram refletidas, como um fenômeno bizarro ou doença estranha. Ela tentou levantar-se, mas a tontura se intensificou, fazendo tudo rodar e forçando-a a voltar ao chão. Olhando em volta uma segunda vez, começando a se perguntar que coisa estranha haveria acontecido com seu corpo, ela tomou um susto ao reparar na pessoa que a estivera observando sem ela perceber.

Ele era um rapaz bastante alto, e de rosto difícil de enxergar, talvez por estar tão tonta. Usava uma larga camisa que batia abaixo da cintura, jeans escuros igualmente compridos e uma meia cinza tirada pela metade em um dos seus pés, em contraste com o tênis amarrado no outro. Seu cabelo quase no pescoço era meio liso, porém bagunçado, e caía sobre sua testa e olhos, dando a impressão de que não podia enxergar direito enquanto deixava seu rosto mais escondido. Apesar do bigode e da barba média que cobria as faces, sua boca era bastante visível, com uma expressão de receio. Ele não dava a impressão de que se cuidava bem.

- Q-quê?

Com certeza ela tinha falado, perguntando ilogicamente a ele ou a qualquer um que pudesse responder suas dúvidas, enquanto de novo tonta, baixava a cabeça. Mas sua voz não tinha saído. Apenas um eco distante dela chegou aos seus ouvidos, e Marina continuou a olhar bobamente à sua volta, meio assustada.

- O que é isso? – e de novo se assustou com o som que saiu de sua boca, abafado e longíquo, difícil de ser escutado pela própria autora. Começava a ficar nervosa pouco a pouco com tudo aquilo, e a perceber que algo sério devia ter acontecido.
O rapaz, em preto e branco como todo o resto e trêmulo, começou a falar algo (ou pelo menos a tentar), enquanto fazia gestos tímidos e mexia a boca mudamente. Era como estar em uma dimensão diferente de outra pessoa, ela notou distraidamente enquanto se esforçava para tentar ouvir algo.

Durante alguns minutos em que a tensão crescia, os dois continuaram em confusão, Marina a cada instante entendendo melhor a gravidade que a situação deveria ter enquanto ia se recobrando da tontura e se levantava cada vez mais. A certa altura, quando distraiu-se pela aparência do ambiente e deixou de tentar ouvir o rapaz, e estava a pensar como as plantas a lembravam do jardim onde certamente estivera a pouco, todas as cores apareceram de súbito.

O verde das folhas e o azul de um céu meio escondido foram refletidos, a assustando. Antes que pudesse se tranquilizar ao ver as coisas voltarem ao normal em sua visão, as cores desapareceram outra vez. Ela olhou para o rapaz, perdida, como quem pede uma explicação. Ele fez uma cara totalmente embaraçada, e olhou para o chão.

Não demorou até que as cores voltassem de novo, fossem de novo, e tornassem a voltar, até que voltaram por tanto tempo que ela achou seguro dizer (ou pelo menos ter esperança) que o fenômeno não fosse se repetir. O pior da tontura também havia passado, e embora não se sentisse muito melhor, ao menos conseguia ficar de pé e andar em volta da clareira.

- Eu... Me chamo Marina. – ela arriscou dizer novamente, pois uma lógica estranha a instigava a acreditar que a audição dela e do estranho também estivessem normalizadas. E parecia estar melhor, no mínimo. Com certeza ela conseguiu ouvir, ainda com um leve eco e com um tom estranho, mas sem dúvida a sua voz, baixa e um pouco fina. - Quem é você?

- R-Rodrigo. – o estranho falou com um sobressalto, como se ela tivesse falado de surpresa e assustado ele. A voz dele era baixa, um pouco grossa e meio difícil de se entender, como se não quisesse estar falando daquele jeito. Olhou para o chão de novo.

Ela sentou mais uma vez no chão de terra, um pouco mais aliviada.

- Ainda bem... – suspirou a garota. – Acho que aconteceu algo de sério comigo... Eu...

Ela levou a mão ao coração, e surpresa, percebeu que a blusa estivera aberta, mostrando o sutiã branco e um pedaço dos altos seios. Envergonhada, fechou a blusa rápido, pensando que não era para menos o rapaz estar tão embaraçado até agora durante todos aqueles minutos.

- Eu... eu também. – Rodrigo falou abruptamente, com certeza tentando mostrar que não estivera olhando o pequeno acidente. – Eu tava vendo tudo em preto e branco...

Ela levantou a cabeça, assustada. Um fenômeno daqueles que acontecia em mais de uma pessoa?

- Mas... também aconteceu isso comigo. E minha voz... – ela se lembrou. – Agorinha mesmo, você me ouviu falar?

Ele balançou a cabeça.

- E eu tava tão tonta... Você viu, né...

Rodrigo respondeu com um “É”, com o coração disparado. De fato, não lembrava de estar tão nervoso em muito tempo. Não tinha a mínima ideia do que podia ter acontecido a eles dois, e nem estivera tentando entender. Só estava paralisado, desde que acordara, pela imagem da garota. Tudo o que sabia era que num momento, tinha acabado de chegar em casa e começava a tirar os tênis, e no outro, tinha ido parar num lugar selvagem com a cabeça cheia de sintomas estranhos. Mas isso não importava nem um pouco, nem o deixava tão nervoso quanto as perspectivas que passavam atropeladas em sua mente: estava isolado com uma garota tão gostosa como ele não via há muito tempo, sem pista alguma de quanto tempo levariam para voltar para casa, ou se chegariam a voltar facilmente.

Rodrigo não era apressado e nem agitado. Desde que acordara, com certeza tinha ficado intrigado com a situação e tentando imaginar algum tipo de resposta plausível, mas desde que pôs os olhos na garota desmaiada com a blusa aberta sua mente ficou em branco. Ficaria em branco de qualquer jeito, é verdade. Com ou sem garota – ele era dado a frequentemente passar pelas situações sem pensar muito e nem tomar decisões; apenas seguia o caminho mais provável. Além de ser extremamente tímido e recluso.

Ele ficou esperando ela falar mais algo, sem tirar os olhos, enquanto ela observava distraída a vegetação.
- Como pode...?

Ela se abaixou de novo, pasma ao notar o arbusto de espinhos secos que crescia ao pé de uma árvore claramente tropical e úmida. Um pouco além da clareira, ela notou, estava um grupo de cactos amarelos e finos, não muito longe de uma pequena poça abaixo da árvore, em que boiavam cerca de meia dúzia de miniaturas de vitórias-régias, cada uma com um broto de flor rosa.

- Esse lugar... não é normal. – ela admitiu, se assustando cada vez mais enquanto jogava os longos cabelos para trás para observar melhor.

Rodrigo tentou falar algo.

- Ahn... Como... Como você chegou aqui? – ele perguntou com aquela voz estranha, difícil de entender.

Marina virou-se para ele com uma expressão intrigada no belo rosto. Ele sentiu um leve arrepio ao se ver encarando-a de novo.

- Digo... – ele percebeu que tinha falado de um jeito errado, nervoso. – O que... Onde você tava antes de... desmaiar?

- Eu tava em casa. – o olhar dela ficou desfocado, como quem tenta se lembrar. – Com sono, eu acho...

- Eu também tava em casa... – Rodrigo achou que talvez fosse melhor darem um rumo sobre o que deduzir e tentar falar algo útil. – Com um pouco de sono também... Mas isso n-não faz sentido. Como... Como duas pessoas... Sabe... Parar nesse lugar...

- Eu não consigo entender. – concordou ela. Agora que estava um pouco mais calma e pensando melhor, Marina voltou a pensar mais normalmente. Acontece que ela era uma pessoa tão inocente e altruísta que na maioria do tempo sempre acabava pensando na situação dos outros antes da sua. E agora que havia se acalmado começou a pensar por qual tipo de situação triste ele devia ter passado antes de encontrá-la, sozinho naquele ambiente desconhecido e arrancado de sua casa. Quase esquecendo que ela havia passado o mesmo – era assim que Marina pensava, como se a sua situação e a do outro não tivessem diferença em importância.

Rodrigo ficou envergonhado ao ver ela olhar para ele com uma cara tão complacente.

- B-bem... – ele tentou raciocinar; era meio difícil. – A gente tem que explorar esse lugar e pedir ajuda. Vamo ver se conseguimos entender como viemos parar aqui...

- É. – assentiu ela, ainda com uma expressão triste.

Eles foram andando, ao saírem da clareira iluminada e se aventurarem mata adentro, reparando na vegetação que não existia em qualquer livro de Geografia; Rodrigo atrás, como era hábito dele de andar depois das pessoas. As dúvidas iam crescendo em suas cabeças, querendo ou não, e os deixando inquietos. Como alguém poderia sair de uma cidade e acordar numa mata tão bizarra sem uma explicação? Nenhum dos dois estava com o celular, e isso só piorava a perspectiva de entender o que havia acontecido. Parecia que estavam em algum filme de mortes sangrentas; Rodrigo não parava de olhar por trás do ombro enquanto andava ainda com a meia pela metade em um pé e o tênis amarrado no outro.

- ...eu acho que pode ter sido alguma droga. – Marina ia dizendo com aquela voz fina e feminina. – Toda aquela tontura, e...

- Deve ter sido um sequestro ou algo assim. – acrescentou ele, enquanto a ficha da situação finalmente ia caindo. Ele sentiu um gelo imenso na barriga, arregalando um pouco os olhos escuros – Será que nossos órg...

Marina deu um grito assustado, pulando para trás instintivamente. Rodrigo olhou, igualmente chocado. À frente deles e enterrada no chão, estava algo que devia ser uma planta marrom com forma de ostra, com extremidades pontudas como pequenos dentes, que havia se fechado com violência no momento em que ela quase pisou, distraída.

O corpo de Rodrigo percebeu antes de sua mente que quando ela havia pulado para trás com o susto, tinha encostado completamente e com força os quadris largos em seu corpo, e agora apertava a coxa esquerda dele, assustada. Ele não ousou se mexer, com o coração a mil e a boca entreaberta de surpresa.

A planta, ou seja lá o que aquela coisa fosse, foi abrindo devagar outra vez, e Marina deu a volta ao redor da grama amarelada que estava ao redor, sem nem ao menos perceber o que havia acontecido entre eles. Tratou de tomar distância ao máximo da planta bizarra, e foi em frente.

Sem dúvida bastante excitado sexualmente, ele ficou alguns instantes parado e de boca entreaberta, tentando se certificar da sensação das nádegas dela em contato direto com seu corpo, sua cintura ao alcance pleno das mãos e a mão dela em sua coxa, como se estivesse a se perguntar se as drogas que causaram todos aqueles efeitos agora estavam a fazê-lo imaginar coisas. Com uma sensação de anestesia no cérebro e uma expressão de quem havia levado um soco maravilhoso, ele seguiu ao redor da criatura que mordia também, quase sendo mordido. Os sons que vinham da planta fechando e abrindo continuaram a ecoar pela mata mesmo depois que já tinham se distanciado.

Um minuto de caminhada silenciosa depois, onde ela estivera absorta a tentar entender exatamente onde no mundo existiria uma planta daquelas, Rodrigo se perguntou se ela estaria talvez chateada, e sem pensar, divagou se deveria pedir desculpas pelo ocorrido.

- Eu... Foi m-

Um ruído cortou a sua fala, fazendo-se ouvir em volta da mata. Era um ruído profundo, quase como um trovão, mas definitivamente vinha da terra e estava próximo. Marina olhou para ele, como que para certificar-se se não era outro efeito bizarro em seu sistema nervoso igual ao do desmaio.

- Vamos! – ela chamou, correndo na direção do barulho. Era certo que esperava encontrar alguma pista do que quer que tivesse acontecido, ou no mínimo qualquer um a quem pudessem perguntar em que lugar do mundo estavam.

Os dois correram com cautela pela vegetação sem sentido, parando aqui e ali para se orientarem pelo ruído, que se repetia cada vez mais alto e distraído, Rodrigo deixou o único pé do tênis para trás ao passar por alguma raiz exposta, e continuando com uma meia pela metade no outro pé sem dar importância. Até que, ao chegarem a uma gigantesca árvore de casca grossa e raízes proeminentes que saltavam da terra e se estendiam por bem uns cinco metros cada, puderam ouvir com clareza vozes estranhas.

Os dois andaram mais devagar ao redor das raízes, tentando ouvir. Atrás da árvore enorme, numa outra clareira podiam-se ouvir duas vozes. Uma era estranha demais – era estridente e alta, mas ao mesmo tempo conseguia ser grossa. O dono da voz parecia irritado, e uma ou duas vezes o ruído do trovão se fez ouvir, muito mais alto que antes, enquanto ele gritava. A outra voz, que falava em um tom assustado, como se respondesse à outra, parecia ser produzida por uma pessoa com sérios problemas de garganta, ou hormonais. As vozes não falavam na língua deles – de fato, era difícil identificar o que falavam, e a única explicação era ser outro idioma.

Eles ficaram parados em pé, visivelmente indecisos sobre ir encontrar quem estava discutindo ou não. Pelos ruídos, parecia que um deles estivera batendo em um dos troncos de pinheiro que havia por ali, e pelo estado do que podiam ver da árvore os golpes ou eram bastante fortes, ou bastante furiosos. O que poderiam encontrar com tais vozes e tal força os assustava, e não ousavam nem ao menos dar uma olhada entre as grossas raízes.

Rodrigo tomou um susto.

- Isso... É alemão! – e ficou em silêncio, tentando ouvir mais. Parecia mesmo com alemão, do pouco que sabia ou já ouvira, mas não tinha como confirmar. Mas quando a outra voz respondeu, ele se assustou mais ainda. – Agora... Não... Tem como... E-espanhol!?

Marina tentou ouvir também, e apesar de não entender muito, com certeza era possível sentir algo essencial que mudava nas palavras, algo que não precisaria saber a língua para ter certeza de que ela estava a mudar, de uma para outra, e ainda mais quando uma terceira voz surgiu, fanha como a segunda, e falou em algo que parecia ser uma terceira língua.

- N-não tenho certeza... Mas isso parece ser japonês. – ele comentou abismado.

Até mesmo Rodrigo estava curioso agora, e na mesma hora os dois levantaram da raiz gigante e tentaram ter uma visão de quem estava conversando de uma vez por todas. Acharam uma fresta meio grande na raiz de onde talvez pudessem ser vistos, mas a curiosidade não deixava isso incomodar. Os dois foram até lá com cautela, e procuraram pelas pessoas.

Não eram pessoas.

O que Marina e Rodrigo viram a seguir foi algo que demorou a ser processado por seus cérebros, e mesmo depois de ser processado não foi aceito. Não tinha como ser real. Um medo que nenhum dos dois havia sentido na vida tomou conta de seus corpos, um medo de algo tão inacreditável que fazia toda a situação, desde o despertar do desmaio até aqui, parecer uma piada de mal gosto.

Havia quatro deles. Quatro coisas, ou seres, estavam na clareira pantanosa, ao lado do pinheiro que já ameaçava desabar mediante os golpes sucessivos de antes. O coração de Rodrigo disparou, mais do que quando Marina jogou a bunda em cima dele, e muito mais do que quando achou ter ficado com problemas visuais. Na verdade, talvez nunca tivesse disparado daquele jeito em toda a vida.

Ele ficou alguns segundos parado, tentando absorver a visão. Sentiu que deveria correr, tinha que sair dali, era o óbvio a se fazer. Mas, talvez pela curiosidade de entender melhor, pelo fascínio que era a visão, ou talvez ainda por sua natureza lerda e aérea, ele não se mexeu. Continuou ali, encarando as criaturas, como se fosse continuar fazendo isso por horas. Ela também não havia se mexido, mas era evidente que tremia tanto quanto ele.

Três criaturas estavam encarando uma quarta, como se bizarramente a conversa com vozes que pareciam humanas de antes tivesse sido entre eles. Mas obviamente não tinha como.

Uma das três criaturas era um caranguejo tão enorme que provocava calafrios. Sua grossa carapaça era de um azul-escuro reluzente mesclado a manchas vermelhas aqui e ali. Possuía as oito patas dos caranguejos, dando a ele uma horrível aparência de uma aranha com pinças supercrescida. E o mais assustador era que ele tinha um rosto entre os espaços frontais da carapaça, um rosto quase humano, com dois olhos verdes e uma boca, surreal ao extremo como uma mutação de alguma ficção científica. Tinha uma pinça proeminente em um dos membros, brilhante e ameaçadora, que descansava no chão no mesmo nível do rosto.

A criatura à direita do caranguejo era ainda maior; provavelmente alcançava a altura dos joelhos deles, ou mais. Era um sapo gigantesco, verde-vivo, com quatro patas pequenas que terminavam em uma única unha cada e também tinha um rosto. Um rosto bizarro, de uma boca rasgada e com alguns dentes para fora, e olhos vermelhos que faziam Rodrigo achar que estava olhando para algum demônio. Em cima do corpo do sapo havia uma barbatana maior ainda que o corpo dele, laranja e fina, que lembrava a barbatana dos tubarões, golfinhos e orcas.

A última criatura do trio era nojenta. Brilhava como se fosse uma bolsa d’água viva, era azul-escuro e tinha um rabo de peixe com membranas transparentes. O rosto desta era desprovido de feições, como se alguém tivesse desenhado dois olhos negros e uma boca rasgada em um balão cheio de água. Os membros dianteiros eram bizarros, extremamente pequenos porém com veias aparecendo e algo que deveriam ser mínimos músculos, e terminavam em três garras. Os de trás não eram desenvolvidos, como um girino.

E a quarta criatura que encarava o trio...

- AHÁ!

Rodrigo sentiu um frio extremo nas entranhas enquanto uma adrenalina louca começava a circular em seu corpo. A quarta criatura tinha visto ele e Marina além das raízes, e agora apontava para eles com algo que deveria ser um sorriso satisfeito. Tremendo como nunca, ele finalmente saiu de seu transe e puxou a garota pela mão, correndo como quem corre do diabo.
Mas em alguns segundos, antes que pudessem ter dado alguma distância verdadeira entre eles e as criaturas, aquilo que tinha apontado para eles pulou por cima de suas cabeças e caiu no chão à sua frente com estrondo, encurralando-os. Marina caiu ajoelhada, como se estivesse prestes a desmaiar. Ele não prestou atenção nela pela primeira vez. Estava aterrorizado demais.

Era um ser baixo, que não devia passar muito além da cintura. Verde como um monstro, tinha uma aparência semi-humana que arrepiou todos os pelos do pescoço do rapaz. Sua cabeça era desproporcional e grande, com dois dentes inferiores que saíam da boca gigante e chegavam ao rosto. Seus braços e pernas eram pequenos, mas suas mãos e pés eram enormes, e tinham cinco dedos cada, como um primata monstruoso. Seus olhos eram esbugalhados e davam a impressão de ele não ter pálpebras apesar de piscarem; tinha olhos amarelos e vivos. No topo da cabeça, ironicamente, estava um moicano vermelho e arrepiado, o que confirmou que seja lá como, aquela coisa só poderia ter saído de um sonho maluco ao extremo. Para completar, estava vestido com pequeninos trajes de aparência antiga, talvez medieval, que eram um colete tosco e um tipo de calça com traços indígenas (visto o pedaço que pendia no meio) preso por um cinto. Sinceramente, Rodrigo não censuraria se Marina desmaiasse ou passasse mal, e não entendia por que isso ainda não havia acontecido a ele.

A criatura falou, abrindo aquele sorriso inexplicável com a boca monstruosa e soltando a voz que parecia ter falado algo semelhante a alemão antes. Ele olhou para os lados, pensando em correr, mas algo lhe dizia que não tinha como ganhar distância daquela coisa. E deixar Marina sozinha, talvez morrer, o privaria de algumas situações que o deixavam excitado só de pensar, caso sobrevivessem àquelas coisas e saíssem dali.

Ele continuou falando, naquilo que parecia alemão a Rodrigo, mas era difícil de captar devido talvez a seu coração martelando suas costelas como se quisesse sair de seu corpo, tamanho o medo. Ele ouviu – não, sentiu – as outras três criaturas se aproximando devagar por trás. Estava morto. Ou, no mínimo, traumatizado. Não tinha o menor ânimo de confrontar ou falar algo àquelas coisas.

O ser verde fez uma expressão confusa e desapontada, e então uma voz igualmente bizarra desconhecida – com certeza, de uma das outras criaturas – falou algo por trás de Rodrigo. Ele assentiu, com aquela cabeça de monstro, e falou mais coisas. Mas parecia ser em outro dialeto. Então Rodrigo surpreendeu-se, se possível, mais ainda.

- Não... D-d-dá pra entender.

Era a voz de Marina. Sentada no chão, parecendo assustada como jamais estivera, ela segurava as mãos que tremiam com força, mas falou com firmeza ao monstro. A impressão que dava era que ela queria entender o que ele tentava falar, como se tivesse importância entender seja lá o que uma coisa igual um goblin está tentando dizer enquanto você está à beira de um infarto. Fez-se silêncio.

O monstro, ainda parecendo intrigado, tentou falar novamente, e Rodrigo novamente teve a leve impressão de que as palavras que ele pronunciava lembravam um idioma diferente, apesar de ele não saber qual outra vez. Aquilo tinha que ser um sonho. Um goblin furioso e poliglota numa selva de sabe-se lá quantos biomas misturados. Ele estava começando a ficar lerdo e inerte, ali em pé olhando. Sua mente começava a ficar vazia – mas isso era normal de Rodrigo mesmo - , tamanha a quantidade de informação inacreditável em um único dia.

- E agora, entendem?

Marina, sentada no chão, arregalou os olhos e gritou trêmula.

- S-s-s-sim!

O monstro deu uma risada grossa e satisfeita que fez Rodrigo se arrepiar mais ainda, se é que era possível.

- Então é isso: bem-vindos ao inferno. – ele falou, satisfeito e com um brilho estranho nos olhos amarelos.

Silêncio de novo.

- Qual é, riam um pouco. Uma piada! – e ele deu a risada grossa de novo.

Marina e Rodrigo tinham acabado de cair na brincadeira de mal gosto mais cruel de todos os tempos. Uma que poderia causar ataques cardíacos muito facilmente.

***

Priscila estava começando a perder o controle, finalmente. Já estava gritando “Alguém” e “Socorro” há dez minutos enquanto andava por entre as plantas que mais pareciam fazer parte de outro planeta, e só não gritava “Por favor” porque sabia que esse seria o sinal de que estaria oficialmente em desespero. Ela tentava manter uma aparência calma, como se tentasse convencer a si mesma de que a situação não era tão grave quanto obviamente devia ser.

Não iria conseguir isso por outros dez minutos.

Já achava que deveria ter tomado alguma coisa muito séria de efeito retardado na noite passada quando viu tudo em preto e branco e não conseguia ouvir a própria voz, além da tontura forte. Quando isso passou, resolveu sair da margem do rio e ir mata adentro, para acabar se abismando com as combinações de plantas que qualquer pessoa sem formação escolar saberia que não vivem juntas. Que lugar era aquele?

Descalça, sem nada – literalmente - além do short azul-claro folgado e da camiseta rosa, a loira acabou cansando de andar enquanto chamava, e sentou numa pedra redonda ao lado de uma poça de algo que era muito capaz de ser areia movediça. Tinha que se motivar a continuar falando...

De olhos fechados, ela começou a aceitar que devia estar sem esperança de sair dali tão cedo. Não sabia quem a tinha mandado pra um lugar que parecia tão distante – e não somente isso, como bizarro também -, mas sabia que estava sozinha. Nem mesmo animais apareceram, para que ela pudesse dizer que fez uma ponta como Branca de Neve...

Ouviu passos. Na mesma hora levantou a cabeça e olhou em volta, esperançosa. Com certeza eram passos, alguém estava amassando a grama, gravetos, flores ou lama – seja lá o que mais tivesse naquele lugar maluco. O vulto ia surgindo por trás de algo que deveria ser uma cruza de parreira com cipós, seguido pelos olhos cor de mel ansiosos dela.

Ela sentiu um certo alívio. Realmente era alguém, um alto rapaz moreno, de camisa social, jeans e tênis, bonito e assustado, que se aproximava. Ele parecia ainda mais aliviado, enquanto se encaminhava a Priscila e ela se levantava da pedra. Ela presumiu, chateada, que ele não parecia ser exatamente um morador do local. Tudo indicava que o moreno estava tão perdido quanto ela.

- Graças a Deus... – ele murmurou com uma voz fraca que não combinava com seu porte. Priscila não pôde deixar de sorrir. - Você... – ofegou. – Sabe que lugar é esse?

- Não moro aqui também. – riu ela com ar travesso, escondendo completamente suas preocupações como se estivesse ali a passeio. – E nem você, parece.

- Eu... Tava andando na rua... Acho que desmaiei e... – O rapaz forte colocou as mãos na cabeça, parecendo se desesperar. - Aí eu senti umas coisas estranhas... Desculpa, tô ficando meio sem controle... Isso tudo me assustou muito.

Mentira. Marcos não havia se traumatizado tanto com a experiência. Na verdade, a cada minuto estava mais confiante, após o choque inicial e os sintomas estranhos. Tinha certeza que qualquer que fosse a situação fantástica que estava se desenrolando, ele sairia ileso, e faria de tudo para usar quem encontrasse para isso. Já estava bem mais tranquilo.

- Ah, que é isso. Já pensou se somos os primeiros humanos a irem parar em um planeta desconhecido? – riu ela de novo, igual uma boba despreocupada. Nem parecia que era ela que estava gritando agora há pouco (e que ele deveria ter escutado).

Ele deu uma risadinha nervosa e tímida, na medida certa, como sempre.

- Sou Marcos...

- Priscila.

Apesar de por fora parecer leve e sem consciência da situação – ou no mínimo muito idiota -, Priscila havia tornado-se extremamente atenta desde que ele aparecera. Todos os seus movimentos, olhares, expressões e tom de voz não passavam despercebidos pelos olhos espertos da loira, e ela sabia que a qualquer momento poderia ver uma brecha para ter base em achar ele suspeito ou inocente. Não tinha como saber se não fora ele mesmo que a havia trazido àquele lugar (apesar de tudo o que ela lembrar antes do suposto desmaio era estar em seu quarto, procurando uma calcinha), ou se mesmo sendo inocente, ele poderia vir a ser alguém perigoso se passando por vítima. Os olhos cor de mel encararam com inocência o rosto, com uma dúvida que começava a crescer a respeito do sujeito.

Os dois estavam, de fato, em duas frequências diferentes ao mesmo tempo. Uma em que eram um trêmulo e tímido perdido e uma pateta aérea, e outra em que ele assumia o papel de quem queria ganhar a confiança dela para ter melhores chances de sobrevivência, enquanto ela avaliava cada movimento dele com absurda rapidez e detalhismo. Era um verdadeiro duelo para ver quem sacava a intenção do outro primeiro.

Marcos olhou um pouco para o cenário, pensando em fazer algum comentário casual sobre a vegetação, mas lembrou-se de algo que honestamente havia esquecido.

- Putz... Esqueci que tô com meu celular, que burro. – ele apanhou o aparelho no bolso, sem paciência para fingir que estava com as mãos trêmulas dessa vez.

Ela notou que ele parecia sincero. Talvez não fosse realmente tão suspeito quanto havia pensado.

Ele digitou algo e pôs o aparelho no ouvido, tentando de verdade, pelo seu próprio bem.

- Droga... Fora de área. – desanimou-se por dentro e deixou transparecer. – E o seu?

- Não trouxe. – nem bolsos tinha no short; parecia uma sem-teto. Ela continuava com a expressão aluada estampada na cara. – É bom a gente dar uma olhada por aí então, né?

- É. – ele respondeu a encarando com aquela máscara de assustado e tímido, que apesar de bem executada não escapou ao julgamento dos olhos da garota. Novamente, ela sentiu a frieza por trás da expressão e voltou a questionar-se sobre o que pensar dele. Ainda não tinha se decidido, talvez ele realmente estivesse se fingindo por alguma razão. Ou poderia ser uma impressão causada pelo estresse de tudo que estava acontecendo.

Mas os pensamentos da loira sobre o que achar disso, querendo ou não, logo tiveram que mudar de rumo. Pouco após alguns minutos de caminhada, em parte notando a vegetação, em parte prestando atenção ao que Marcos pudesse fazer, Priscila teve que parar de andar e acabando por deixar de pensar nisso. O motivo de os dois pararem, espantados, estava bem à frente, claro como o dia.

À sombra de uma fileira de oliveiras, que pareciam ter sido plantadas em fileira de propósito, estava um animal selvagem. Deveria ser um filhote de onça, talvez leão ou até mesmo um gato-do-mato. Era difícil para eles se concentrarem na espécie, pois estavam impressionados demais com a presença do animal. Mais do que o medo de serem atacados, tanto Priscila quanto Marcos sentiram aquilo nos olhos azuis da fera, que viera andando calmamente com suas patas de garras afiadas pelo caminho oposto até topar com eles. Ele tinha um tufo avermelhado de pelos no topo da cabeça, como um topete. O que mais assustou Priscila foi o rosto do felino – era como algo fantástico, uma expressão inegavelmente humana nos traços da boca fechada e nos olhos que encaravam os dois. Por alguma razão, ela sentia que era como se o filhote de fera pudesse falar a qualquer momento.

- São vocês.

Priscila piscou. Marcos também pareceu aturdido.

Sem dúvida o felino tinha falado, tão naturalmente quanto qualquer um, sem sotaque reconhecível, com uma voz que facilmente passava disfarçada como um homem de trinta e cinco anos, decidido e com um quê de arrogância. Não, não tinha como Marcos ser suspeito de o que quer que fosse. A não ser que ele fosse um alienígena daquele planeta onde animais falavam. Ambos não ousavam tirar os olhos do animal, com medo de não poderem dizer que viram com os próprios olhos o que aconteceria em seguida.

- Lionill... Gurai. – ele fechou os olhos por um instante enquanto continuava a falar no mesmo tom sério e profundo de homem adulto, seja lá o que aquilo fosse. Era como estivesse se apresentando, mas era bizarro demais para ser aceito. Mas era o que parecia ser – o nome dele. – Devo começar a explicar sozinho, suponho.

A garota, em um impulso louco, decidiu que provavelmente entraria para a história e ganharia prêmios mais fácil se se apresentasse ao animal falante antes de Marcos.

- Meu... nome... é... Priscila. – ela deu um passo à frente e falou com o animal, como se fosse a coisa mais natural do mundo. O queixo de Marcos finalmente caiu, ao olhar para a situação. – Você... É...

O felino deu um rugido baixo que parecia um suspiro, interrompendo-a. Ela calou-se, ainda com o sorriso bobo no rosto, enquanto olhava ele andar lentamente para trás, como se fosse avançar com unhas e dentes. Na hora em que Priscila começou a achar que de fato era isso o que ele iria fazer, um ruído fez-se ouvir atrás dos humanos. Algo parecia ter caído no chão do alto, e a muito custo Marcos e ela viraram as cabeças para ver o que foi.

Cada vez mais ela achava estar em outro planeta, pois dessa vez o ser que havia aparecido era um soldado que devia ter sido transferido para o corpo de um lagarto gigantesco e bípede, completo com um colete, capacete e tinta de camuflagem azul por cima das escamas. Tinha olhos amarelos que se mexiam olhando de um para outro.

A boca de Marcos estava aberta até o chão. Priscila forçou-se a falar algo para não ficar louca de vez, virando-se para a nova criatura.

- Quer ver como eu sou foda? Você sabe falar também. – apontou. Uma dor de cabeça que não tinha relação com a ressaca começava a aparecer.

O enorme réptil, que também tinha feições humanas, parecia receoso de alguma coisa, mas falou.

- Então... Então vocês são os aliens. – do nada, Marcos sentiu uma vontade incrível de socar o soldado lagartixa. Eles?

Priscila começou a rir, sem opção. Virou a cabeça pra cima e deu umas risadinhas; algum dia tudo faria sentido, com certeza. Sua sanidade começava a ir embora, com rapidez. Enquanto dava outra olhada na paisagem que nunca ficava velha, viu uma coisa vindo na direção de todos eles, enquanto um grito distante chegava a seus ouvidos. A essa altura, era possível qualquer coisa no mundo aparecer, então ela não hesitou em gritar com uma certa urgência:

- Cuidado!

Um segundo depois, Marcos havia se jogado para o lado com uma incrível rapidez de reflexos. Não muito distante, havia caído fogo no chão. Fogo, vermelho e fumegante, perfurou a terra batida e soltou fumaça. Priscila finalmente caiu sentada, perdendo a cabeça. Ficou quieta, olhando para baixo enquanto ouvia o que se passava.

Outro grito se fez ouvir, antes alguém pudesse dizer mais alguma coisa. Vindo do alto, planava mais outro ser inacreditável – só podia ser um dragão. A parede psicológica que Priscila usava para suportar tudo começava a ruir, afinal. O ser pousou com estrondo perto do soldado lagarto, que também saiu para o lado, assim como Marcos. Com uma cambalhota desajeitada, ele caiu no chão, embolando-se na terra. Ele gritou algo em alguma linguagem desconhecida, e parecia se dirigir ao humanos. O felino grunhiu, irritado:

- Você esqueceu a linguagem deles? Preste atenção em alguma coisa. – falou de forma solene, como se fosse óbvio que estava cercado por idiotas.

- Verdade! – gritou o dragão, se levantando com rapidez do chão onde caíra. Sem dúvida, ele falava com um sotaque mexicano. Toda bizarrice tinha seu limite... ou não. – Como eu disse, essa vai ser minha entrada de agora em diante! Desculpem pela fumaça... Quis impressionar os estrangeiros! – e abriu um grande sorriso que parecia de algum monstro de filme de terror.

Marcos arregalou os olhos para a criatura. Era grande, passava de sua cintura. Tinha um corpo escamoso de alguma cor entre o verde e o azul, ele não saberia dizer qual. Sua cabeça sem dúvida só poderia ser de um dragão, arredondada porém com um ligeiro alongamento na parte do focinho e boca, com tocos de chifres vermelhos de dragão chinês no topo, bifurcados. O lado de trás da cabeça parecia ter escamas em um formato de grandes espinhos. Também tinha um par de asas do mesmo vermelho, e um rabo quase tão grande e largo quanto o tronco, que balançava feliz. Tinha três dedos nas patas – mãos, pelo que parecia -, com grandes unhas cada, e pés chatos também com três garras grandes. A barriga e a parte inferior da boca eram brancas, e nos seus olhos vermelhos profundos estava uma expressão de completa excitação.

Marcos ainda não sabia como conseguia observar tudo sem enlouquecer, mas era certo que de alguma maneira todas aquelas coisas estranhas tinham o efeito de uma ofensa pessoal a alguma coisa dentro de si. De fato, um tipo desconhecido de raiva começou a despertar dentro do rapaz, ao ver monstro após monstro aparecendo diante de seus olhos.

- Calma... – murmurou o monstro soldado de seu canto, ainda tímido. – Não assuste os aliens...

Foi a gota d’água.

- Ah, não foi nada, Foxy. – o dragão soltou uma gargalhada infantil e boba com aquela voz que misturava uma criança e um monstro. – Vamos agora, quando a gente encontrar o resto deles vamos explicar...

- CALA A BOCA! – ele havia perdido o controle. Fora de si, Marcos encarava a criatura draconiana e gritava tão alto quanto podia, como um desafio. Um desafio para responder ao desafio inicial que eles haviam feito por existirem e aparecerem. – QUERO SABER QUE LUGAR É ESSE – AGORA! MONSTROS DE MERDA!

Priscila olhava pasma, sem reação. As três criaturas olharam para Marcos por alguns instantes, até que, para a surpresa das outras duas, o dragão respondeu:

- ÓTIMO! – rugiu ele, tão alto quanto. Seus olhos brilhavam em delírio, parecia esquecer as prioridades. – Preciso de uma luta para ver do que mais este meu corpo é capaz! – e abriu a grande boca, como se fosse avançar em Marcos em bote, enquanto este ainda encarava furioso o réptil.

No momento seguinte, tudo o que Marcos vira foi o filhote de leão aparecer, como um raio, entre ele e o dragão. Tinha uma pata levantada, em um sinal ameaçador de aviso.

- Kept... Que merda você tem na cabeça?

- Posso lutar com você antes, se quiser! Ninguém teve coragem de nos dar um treinamento decente mesmo! – e ele riu, como se nada tivesse acontecido. Riu, esquecendo do que estava para fazer, e continuou rindo e rosnando até ficar calado.
O leão grunhiu, novamente irritado. O lagarto vestido de soldado observava no mesmo canto de sempre, olhando de um para outro. Suspirou de alívio quando o felino baixou a pata com garras.

Marcos havia se recuperado de seu acesso de fúria. Estava arrependido, muito provavelmente havia desmanchado seu papel de garoto bonzinho e assustado que poderia lhe ser útil. Iria tentar mantê-lo de agora em diante, e esperava que o papel não teria sido estragado para com Priscila.

O leão virou-se para Marcos, parecendo exasperado. Agora ele pôde notar que não era um simples animal, não só pela fala, pelo que parecia. Em volta do pescoço, ele pôde ver desta vez, o felino que falava tinha um grande anel, dourado e reluzente, com uma pedra oval verde encravada. Não mais receoso, pensando talvez que se corria algum risco, fora de alguma maneira defendido pelo leão, ele observou enquanto o animal o encarava de perto, e outra vez fazia a pose de bote que estava a fazer antes de o soldado réptil aparecer das árvores. Iria dar mesmo um bote?

A pata dianteira que estava mais atrás brilhou, e um segundo depois, uma estranha luz surgiu do corpo dele, meio que cegando todos os outros. Da luz, apareceu uma esfera azul, com um símbolo que estava meio ofuscado por todo aquele brilho. Marcos ficou estático sem querer, enquanto via o leão jogar a esfera de encontro a seu corpo. Ele sentiu algo como uma luva de veludo passando em seu braço quando ela fez contato.

O leão suspirou.

- Você, então? – virou-se para Priscila, que ainda estava sentada no chão, e sem cerimônias por já estar irritado, colheu a esfera no ar com um movimento da pata como se pudesse usar telecinese e a jogou em direção à garota. Dessa vez, ao encostar nos seios da garota, o brilho azul se intensificou, e parecia se solidificar enquanto diminuía e se condensava.

Lionill sentiu uma certa satisfação por dentro, mas limitou-se a falar, virando-se para Marcos desta vez:

- Vaniur. É o nome do lugar onde vocês estão.

***

É isso, pensou Jingal. Agora ou nunca.

À beira do lago, ele sentia-se dividido entre seus sentimentos de maneira horrível.

Mexa-se! Agora!

O corpo do humano flutuava sobre a superfície negra da água. Em breve estaria inalcançável.

Não posso. Não quero.

Ele não queria participar da maldita missão. Estava bem, estava confortável, mesmo que não conhecesse nada ainda do mundo para onde acabara de ser mandado. Queria fugir, desobedecer ao favor que fora pedido deles. Gostava de viver, era uma sensação boa. Poder ter a liberdade de escolher entre viver para uma missão ou viver por viver. É verdade que talvez tivessem liberdade depois de cumpri-la, mas... Mesmo estando preso à vida por tão pouco tempo, Jingal tremia de medo, por alguma razão, ao pensar em morrer. Não queria lutar. Não queria se envolver com ninguém perigoso, muito menos com os tais aliens.

Alguma coisa dentro de Jingal pensava diferente, e ele tentava reprimir essa fração de razão contrária. Estaria pondo outros em risco... Talvez valesse a pena tentar... Talvez tivesse algo que valeria a pena, apesar de se arriscar. Salvar alguém. Servir para salvar tudo aquilo que estava em risco na missão, e começando por salvar aquele corpo que boiava fragilmente, desmaiado.

Sentindo que não poderia voltar atrás em uma decisão tão séria, mas ainda querendo imensamente poder sumir, se esconder, fugir de seu medo, Jingal lançou-se à agua.
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